quarta-feira, janeiro 23

O Amor é Substitutivo

- Caralho, mas que lugar fedorento!
Não consegui conter as palavras. Mal abri a porta e já veio aquele cheiro podre do qual quase me esqueci completamente. Eu estava voltando das minhas últimas férias amorosas, bem prolongadas dessa vez, na casa de Magê e agora seria definitivo.
Coloquei a mala em cima da cama, era um fim de tarde, então acendi um cigarro e me sentei na janela da cozinha/sala. Tentei não reparar na casa, nas latinhas de cerveja pelo chão, nas cinzas em cima da mesa, nas correspondências embaixo da porta e, principalmente, nas fotos daquela vadia na geladeira. Apenas fumei o meu cigarro e observei a rua, como ha tempos não fazia.
Sinceramente, era bom estar de volta. Cheguei a sentir saudades da minha sujeira, do meu desleixo e até das pequenas orgias que aconteciam por aqui. Magê era sistemática demais. O seu dormir tarde não era tão tarde quanto deveria, o seu trabalho não era tão empolgante quanto deveria, cheio de horários, prazos e regras. Seus valores eram bem interessantes, toda cheia de si, mas não curtia nem um ménage. Seu humor me instigava as vezes, as mudanças repentinas poderiam ser um desafio do qual eu sempre vencia, até que cansei.
Cansei do seu stress, das suas preocupações, dos seus problemas quase sempre ínfimos, mas que se tornavam enormes quando do drama. Cansei da sua neura com a casa limpa, dos seus gatos infernais que pisoteavam meus livros, meus escritos, minha cara. Cansei da sua insegurança, da sua neurose, dos seus ataques, da sua raiva.
Depois do cigarro, resolvi tomar um banho, mas esqueci que a água estava cortada então deixei para depois. O único problema nesse pequeno trajeto (janela da cozinha - porta do banheiro), foi passar pela merda da geladeira, e por aquelas fotos escrotas. Ela sorria, resplandecente ao meu lado, enquanto segurávamos nossas canecas de chopp. É... Magê sabia beber! Deixava qualquer merdinha de 20 anos caindo em ebriez. E dele ria, naquele mesmo sorriso da foto. Que merda!
Olhei pra cama, há quantos meses ela estaria bagunçada? Magê gostava de arruma-la todas manhãs e isso era um saco. Eu gostava era de bagunçar, de joga-la de um lado pro outro. Seu sexo era realmente incrível e talvez eu precisasse de um pouco disso. O melhor da vida é isso e ócio.
Pensei em comprar uma cerveja, la fora fazia um calor do caralho. Mas me lembrei que também estava sem energia e cerveja quente só pioraria meu humor. Resolvi fumar um baseado e ficar no sofá. Deixo tudo pra amanhã: as contas, a pequena limpeza, a mala, as fotos, o sorriso, Magê... Ela gostaria de fumar um baseado aqui, lugar pequeno, bem aconchegante, a fumaça pairando... é, definitivamente, Magê gostaria de estar aqui agora.
Mas não, ela não está. Verifiquei minha carteira, tinha grana suficiente para passar um mês aqui, ou para passar uma noite na Augusta, enquanto procuro outro bico. O bom de ser fotógrafo é que sempre tem alguma fresca querendo pagar de modelo. E quem sabe assim não encontro uma outra Magê, linda e fútil, gostosa e apaixonada, sexy e neurótica. A vida é feita de ciclos e encerrei o meu mageniano.
Voltei à carteira, voltei a mim. Olhei no relógio: 20h. Tomei meu banho gelado e corri em direção ao metrô. Nada como uma Augusta para curar uma Magê.

segunda-feira, janeiro 21

Na beira de um penhasco, é tudo ou nada.
E agora vai, voa, blackbird!