sábado, junho 5

Peraí que eu to chegando!

E você, já se acostumou com a dor?
Aquela menina que eu vi no quadro já. Tem olhos conformados, numa expressão que não se sabe se era de desamparo ou indiferença. Era um misto. Talvez fosse tanto desamparo que a indiferença já a tenha tomado em seus braços. Bom pra ela, tá no aconchego.
E quando reparou que eu olhava, saiu do colo e me encarou. Olhou fixamente, tão fixamente como eu não via há algum tempo. Esse olhar me fez vacilar ou viajar, ainda não sei, só me lembro daqueles olhos tão comuns para mim, deixando de ser olhos de menina para se tornar olhos de mulher.
Se vacilei ou viajei, ainda não sei, mas lembro dela se aproximando. Se foi depois de um minuto ou uma hora, ainda não sei, mas ela estava perto, sussurrando ao meu ouvido. Demorei tempo demais para entender o que ela dizia, na verdade ainda não sei muito bem, algo com paisagens. Devia ser a paisagem do seu quadro, um quarto com uma janelinha que dava vista pro nada, um muro.
Ela sussurrou por muito tempo e eu, por preguiça ou burrice, não consegui ouvir de tudo.
As vezes eu acho que ela continua sussurrando, mas estou no meu vacilo, ou na minha viagem, longe demais para ouvir o que ela me diz.
Só espero ouvir antes que desses olhos de mulher se perca o olhar. Antes que seja tarde, para ser mais exata.
E, num intervalo do meu vacilo, ou da minha viagem, começo a associar. O quadro volta a ser um espelho e a menina, que virou mulher pelo olhar, volta a ser menina. Por quanto tempo?
É, neguinha, a farra acabou.
A galera calou,
O bar fechou,
E você aí, perdida no tempo ainda.
O que lhe falta não é o que se foi.
Falta a compreensão.
O que rima com passado?
Pra você era só uma saudadezinha, mas agora é o que?
É só pior do que antes.
As coisas se acabaram, calaram, fecharam, pioraram.
Nada rima.